Ficamos mais tristes com a perda da Rainha da Sofrência, uma palavra nova incorporada ao vocabulário popular que significa uma mistura de sentimento com carência. Marília soube magistralmente compor e interpretar essa combinação e acumulou prêmios, bateu recordes de vendas, colocando a figura feminina no centro de um universo antes dominado por homens: o sertanejo. Na padaria fiquei sabendo da confirmação da morte da cantora e compositora Marília Mendonça. Assustado com a notícia, comecei a observar os comentários das pessoas. “É muita ganância fazer tantos shows na pandemia”, “Ela não tinha religião, deve ser isso”, “Deixar um bebê em casa para cantar, não valorizava a família”. Foram muitos os julgamentos súbitos, algo totalmente sem noção. Não se tem o direito de morrer em paz no Brasil sem a culpabilidade pública e pudica que impera em terras tupiniquins.
Confesso que o sertanejo não é meu estilo musical predileto. Mas Marília Mendonça tinha um diferencial, um borogodó na voz que não tem como explicar. A gente só sentia o pulsar de uma cantora afinada que cantava com o coração, uma voz potente e articulada com as emoções de uma geração que veio para quebrar tabus.
O Brasil está mais carente com a partida da Rainha da Sofrência, aos 26 anos. Uma sexta-feira que não ‘sextou’ e que foi “Infiel” as expectativas de milhões de fãs que acompanhavam o trabalho desta goiana que permaneceu pouco tempo entre nós, mas que deixou uma história de superações e conquistas. Que seu legado seja como o número de sua data de nascimento: infinito!
Éverlan Stutz é professor, poeta e jornalista
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